sexta-feira, 6 de abril de 2007

"Olho Zen" haicais

Amigos,

Aqui alguns dos poemas haicais constantes em meu 4º livro publicado, “Olho Zen”, em 1999, com edição de autor, em Blumenau/SC, cidade onde eu morava na época. O lançamento ocorreu no espaço cultural da Semed, onde fiz também uma exposição de arte digital e projeção de imagens digitais. Os não-iniciados na arte do haicai, em geral estranham esse tipo de poema. É uma modalidade de poema popular de origem japonesa, medieval, mas atualmente praticada em muitos países. Em geral, são três versos, de 5, 7 e 5 sílabas poéticas cada um, e conta com um “kigô”, ou termo de estação, que associa o poema à uma das 4 estações, que por correspondência, está associada à algum sentimento. Um dos versos apresenta uma imagem e noutro versos acontece um movimento, uma ação na cena. No último verso, o poeta apresenta sua percepção da cena, mas não de forma direta, é o zen, em linguagem subjetiva. O haicai (haiku, em inglês e hokku, em japonês) perpetua um momento presenciado pelo observador, em seu núcleo de eternidade. Quem não entender é porque entendeu. Entendeu?




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estrelas e estrelas
caíram todas aqui?
ah os pirilampos!



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mais de vinte garças
nas ramagens sobre o rio
brancas azaléias



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o rio leva o galho
passeando de carona
vai um passarinho



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corujinha branca
solitária companheira
na ponte de ferro



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sabiá na janela
legenda desse gorjeio
bom dia desenhista



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na rosa dos ventos
foram-se as folhas e as flores
ficou o bicho-pau



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brilha o sol no orvalho
porque chorou essa bromélia?
lágrimas do céu




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flor alaranjada
chegou cedo a primavera?
ah os cogumelos



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meia-noite em ponto
o chão se move no escuro
trilha de formigas



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ouro na prainha
pingos de sol no gramado
ipê amarelo



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luz do sol na teia
pequenina tecelã
tece fios de ouro



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silêncio no bosque
o quê estão a sonhar
os gatos da Edith?



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depois do poente
manto azul em Blumenau
tecido de noite



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na beira do rio
em côro cantam os pássaros
_quero, quero, quero!



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um camaleãozinho
longe do mato que verde
mora em sua pele



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noite de lua cheia
só o murmúrio do açu
e este haicai



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rio Itajaí
capivaras pela margem
desenham o açu



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debaixo da ponte
mergulha uma capivara
acorda o mendigo



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plena luz do dia
namoram as capivaras
na cervejaria



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tic-tac dos teares
atrapalha o sono justo
dessas capivaras



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perto da Macuca
vinte e uma capivaras
será assembléia?



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ao sol do meio-dia
as capivaras sonham
o rio que transborda



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cio das capivaras
uma lua de prata espia
esse par feliz




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dia de maratona
capivaras vem à tona
se amar à toda



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pia joão-de-barro
ainda prefiro teu canto
ao da catedral



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violetas azuis
esta tarde não passou
em brancas nuvens



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flor-de-algodão
será parte de um vestido
estampa de flores




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cruzeiro-do-sul
o céu uma cortina preta
atrás o que tem?



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céu acinzentado
foi o sol que esqueceu
de bater o cartão



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eclipse solar
meia-noite ao meio-dia
cantará o galo?



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rubro horizonte
pôr-do-sol em Blumenau
o rio escarlate



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paralelepípedos
a rua XV vermelha
poente cor de sangue



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orquídea azul
orna um galho sobre o rio
um pássaro açu



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dormia o sapinho
terá saltado no lago
ou foi só um sonho




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rosa perfumada
sob a pétala cor carmin
esconde um espinho



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goteja o orvalho
as gotas de sol na teia
pequena mandala



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despido de nuvens
um sol brilha lá no céu
outro ali no rio




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andorinha azul
a bruma branca do açu
oculta seus vôos



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céu de pedra ônix
há um segredo de prata
por trás dessas nuvens




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as folhas se tocam
duas palmeiras namoram
o vento é cúmplice




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na casa Enxaimel
breves pinturas abstratas
líquem nos tijolos




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canta mais cigarra
essa cidade já tem
formigas demais



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floração do ipê
borboletas amarelas
dançando ao vento




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escultura do Pita
espreguiçam-se os gatos
na braça deserta



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acordo com música
antes dos sinos da igreja
canta o bem-te-vi



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brotos de bambu
na sombra do mausoléu
a vida prossegue



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pétala vermelha
trazida pela formiga
as outras só folhas




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na beira do rio
divide-se a tarde ao meio
passeio do lagarto



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"OLHO ZEN"

Tchello d'Barros

www.tchello.art.br

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